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Sobre o Amor e a Liberdade
Amar é um ato de força, não de dependência.
Somente o espírito livre pode amar,
porque só ele não teme a perda.
O fraco busca possuir;
o forte sabe que nada é possuível.
Toda tentativa de reter o outro
é um sintoma de escravidão interior.
O verdadeiro amor não diz “seja meu”,
mas “seja o que és —
e se, sendo o que és, quiseres permanecer,
então haverá sentido.”
A liberdade não é o contrário do amor,
mas a sua mais alta expressão.
Quem compreendeu isso já não sofre quando o outro parte,
porque aprendeu que o amor não está no outro,
mas no poder de amar que habita em si mesmo.
Nada se perde, porque nada se possui.
O amor é criação, não captura;
é afirmação da vida, não sua prisão.
Assim, amar é deixar ser.
E deixar ser é o gesto mais elevado
de quem já aprendeu
que a liberdade é o único solo
onde o amor pode florescer.
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II — O Amor como Força do Mundo
Há um amor que não é humano,
e, no entanto, é a essência de tudo que vive.
Não nasce do desejo, nem da falta,
mas do mesmo fogo que move as estrelas.
Esse amor não pede retorno,
porque é o próprio movimento do existir.
O homem comum ama para preencher-se;
o sábio ama para transbordar.
No primeiro há fome; no segundo, abundância.
Quem ainda precisa ser correspondido
ainda não tocou a raiz do amor —
pois quem é inteiro não exige eco, apenas canta.
Deus — se ainda ousas nomeá-lo —
não é senão o amor que cria sem possuir.
O universo é o seu gesto amoroso:
a expansão infinita de um ser que nada retém.
E nós, fragmentos dessa força,
somos chamados a amar como o cosmos ama —
sem fronteiras, sem posse, sem medo.
Quando amas assim, deixas de ser um indivíduo
e te tornas um acontecimento do mundo.
Não amas alguém — amas o próprio ser que pulsa em tudo.
O outro deixa de ser objeto e torna-se espelho,
refletindo o mesmo fogo que arde em ti.
Então compreendes:
o amor não é caminho para fora, mas retorno ao centro.
E o centro é liberdade.
Pois quem ama com liberdade participa
do divino ato da criação:
faz do instante uma eternidade,
e da entrega, uma forma de poder.
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III — O Amor como Reconciliação do Ser
E então compreendi:
o amor é o último nome de Deus —
não o Deus dos altares,
mas o Deus que habita o sopro de tudo que vive.
O amor é o instante em que o finito toca o infinito
e nada se perde.
Nele, o humano se faz divino,
não por fugir da terra,
mas por amá-la até o limite do possível.
Quem ama verdadeiramente redime o mundo,
porque transforma o peso da existência em dança.
Aquele que ama sem possuir
faz do tempo uma eternidade,
e do outro, um espelho da própria vastidão.
Assim falou o espírito:
“Amar é dizer sim a todas as coisas —
ao nascer e ao morrer,
à presença e à partida,
à dor e à beleza.
Pois tudo é um mesmo ato do ser que quer florescer.”
E eu vi que o amor é o mais alto conhecimento,
pois só o amor compreende o sentido de ser livre.
Quem ama não precisa de céu,
porque já o criou dentro de si.
Então o homem e Deus se reencontram —
não em templos, mas no coração liberto.
E o amor, silencioso e radiante,
permanece como o último verbo do universo:
ser.
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