A emoção é um programa complexo
António Damásio proferiu conferência no ISPA
Na
conferência "A neurobiologia das emoções numa perspectiva actual",
promovida pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA), o autor
de livros como "O Erro de Descartes" ou "Ao Encontro de Espinosa"
procurou responder a três questões: "O que é a emoção?", "O que são os
sentimentos?" e "Como é que sentimos uma emoção".
Falando
para cerca de 500 pessoas, entre alunos, professores e investigadores,
sobretudo das áreas da neurobiologia e comportamento humano, António
Damásio apresentou as suas teorias em torno de uma "pergunta central que fez há muitos anos"
sobre o que é a emoção. Para o investigador e professor da Universidade
de Iowa, nos Estados Unidos da América - país onde se radicou -, a
emoção é "essencialmente um programa de estratégias activas e cognitivas". Segundo António Damásio, a emoção desencadeada por determinado estímulo dá origem a "um programa de acções",
diferentes conforme o tipo de emoção, que provocam alterações rosto, no
corpo ou no sistema endócrino (estratégias activas). O corar de um
rosto, a tensão muscular, o aumento do ritmo cardíaco, ou o aumento da
secreção de determinada hormona são exemplos dessas alterações
fisiológicas.
Contudo,
falar da emoção apenas como um programa de acções é restrito demais,
considera o especialista, sustentando que existem também as estratégias
cognitivas, "certos estados mentais que fazem parte do programa completo de acções". Como exemplo, o neurobiologista referiu que "a tristeza obriga a certa estratégia cognitiva": num estado de tristeza, uma pessoa não pensa num jantar agradável e divertido, mas é capaz de pensar na morte.
"É
sabido que é difícil uma atenção focalizada em momentos de extrema
tristeza ou que durante emoções de medo pode haver uma capacidade de
aprendizagem aumentada", disse. Mas a questão da emoção é ainda
mais complexa, porque as emoções (esses programas de acções) são
desencadeadas por determinados estímulos que não têm obrigatoriamente o
mesmo efeito em pessoas diferentes.
Os
estímulos podem ser objectos ou situações, actuais ou existentes na
mente, e alguns são evolucionais e outros são aprendidos
individualmente. "Situações que causem medo ou compaixão são muito antigas e são colocadas em nós pela evolução, estão nos genomas", por isso são evolucionais, explicou António Damásio.
"Mas
se o estímulo que desencadeia emoções é uma determinada pessoa que nada
tenha a ver com a História ou evolução, mas com aspectos de
aprendizagem que tenham só a ver connosco", está-se perante um estímulo individual, acrescentou.
Três tipos de emoções
A
propósito, o cientista referiu três tipos de emoções: as de fundo, que
são mais vagas, como o entusiasmo ou o desencorajamento, as primárias,
que são mais pontuais, como a tristeza, o medo, a raiva ou a alegria, e
as sociais, que são um resultado sócio-cultural, como a compaixão, a
vergonha ou o orgulho.
Passada
a exposição da sua teoria sobre a emoção, António Damásio debruçou-se
sobre o que são os sentimentos, explicando que são por um lado
alterações do corpo que podem ser reais ou simuladas, e por outro
estados alterados de recursos cognitivos.
"Nem todas as alterações que sentimos no corpo são necessariamente as que se estão a passar", pois é possível o cérebro simular essas alterações sem que elas realmente aconteçam.
Quanto aos "estados alterados de recursos cognitivos",
António Damásio refere-se à percepção que a pessoa tem de que algo se
modifica no seu espírito, na maneira de pensar ou na tendência para agir
de determinada forma. No final da palestra, o investigador tratou de
explicar "como é que sentimos uma emoção".