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Tratado sobre as igreja e a Corrupção da Verdade
Há males que se disfarçam sob o véu do bem, e há mentiras que se perpetuam sob o nome da verdade. Entre todos os males que a humanidade engendrou, nenhum se mostrou tão persistente, tão astuto e tão devastador quanto aquele que tomou para si o título de “igreja”. Pois onde o homem buscava a luz, a igreja ergueu templos de sombras; onde o espírito aspirava ao infinito, ela construiu muros e os chamou de fé.
A verdadeira tragédia não está apenas no erro, mas na santificação do erro. A igreja — entendida aqui não como uma comunidade espiritual, mas como uma estrutura de poder e dogma — fez de cada geração um campo de domesticação, e das consciências jovens, instrumentos de sua perpetuação. É na infância e nas mulheres que ela busca o alicerce de seu império moral, porque sabe que quem domina o coração e a imaginação domina o futuro.
A religião institucionalizada não é o culto à verdade, mas o culto à submissão. Em nome do divino, ela aniquila o humano; em nome da salvação, ela destrói o pensamento; e sob o pretexto de elevar o espírito, ela o prende a correntes invisíveis. Nenhuma tirania é mais duradoura do que aquela que se faz passar por virtude.
A ciência pergunta, a igreja impõe; a filosofia duvida, a igreja condena; o homem livre busca compreender, a igreja exige ajoelhar-se. Assim, a dignidade do espírito é trocada pela obediência; e o amor à verdade, pelo medo do inferno. E o que é esse inferno, senão a metáfora mais cruel da ignorância imposta?
As igrejas transformaram o mistério em instrumento, a fé em moeda, a esperança em comércio. Sob seus altares jazem os cadáveres da razão e da liberdade. Pois aquele que teme pensar já morreu para o pensamento — e a morte do pensamento é a verdadeira morte do homem.
Enquanto houver templos onde a submissão é ensinada como virtude, o progresso será uma mentira piedosa. Não se trata de destruir a fé — que pode ser pura e elevada —, mas de libertá-la de suas prisões institucionais. O espírito humano não foi criado para se ajoelhar, mas para se erguer diante do infinito.
Devemos, pois, ter a coragem de quebrar as correntes douradas que chamam de sagradas, e devolver à luz aquilo que os dogmas soterraram. Somente quando o homem reencontrar em si mesmo o templo da razão e o altar da consciência, a verdade deixará de ser perseguida — e o progresso, finalmente, deixará de ser um sonho mentiroso.
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