A vida é o enigma primordial, a interseção entre o acaso e a necessidade, entre o fluxo cego da matéria e o despertar da consciência que ousa perguntar pelo seu próprio sentido. Não se reduz ao simples intervalo entre o nascimento e a morte, pois sua essência não está contida apenas na sucessão dos dias, mas na densidade de cada instante que carrega em si a totalidade do tempo. Viver é estar lançado em um mundo que não pedimos, sustentados por um sopro que não dominamos, e, no entanto, obrigados a transformar esse dom — ou acaso — em destino.
A vida é, ao mesmo tempo, limite e abertura. Limite, porque é atravessada pela finitude: tudo o que vive caminha para a morte. Mas é também abertura, porque é no interior dessa limitação que o infinito se insinua — no amor que deseja eternidade, na memória que resiste ao esquecimento, no pensamento que se eleva além da carne. Assim, cada existência humana é um paradoxo: uma chama breve que, ainda assim, anseia tocar o fogo eterno.
Há quem a veja como fluxo biológico, como repetição de mecanismos que a ciência disseca e descreve; mas, mesmo aí, permanece o insondável — por que a matéria organiza-se em consciência? Por que, no meio da vastidão indiferente do cosmos, emerge um ser que sente, sofre, busca, sonha? A vida, nesse sentido, não é apenas um fenômeno: é um espanto.
E viver é suportar o peso desse espanto, carregando em si a tensão entre o absurdo e o sentido. Alguns a percorrem como quem atravessa um deserto, guiados apenas pela esperança de um oásis; outros a dançam como quem já intuiu que a própria travessia é a fonte secreta da alegria. A verdade é que a vida nunca se deixa possuir: é sempre mais do que qualquer definição, mais do que qualquer plano. Ela escorre por entre os dedos da razão, e talvez só possa ser realmente tocada por aquilo que não pretende capturá-la — o silêncio, a contemplação, a entrega.
Assim, a vida é um mistério que não se resolve, mas se vive; um enigma que não se decifra, mas se habita. É a pergunta que nos constitui e a resposta que nunca se completa. É o caminho e não a chegada, o instante e não a eternidade, a possibilidade e não a fixação. A vida é o próprio espaço em que o homem, frágil e infinito ao mesmo tempo, aprende a ser.
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