domingo, 17 de outubro de 2021

VIDA !!

 Eu me sinto imortal porque a vida não vai me matar com uma tromboembolia, mesmo que eu jamais puxe o embolo da seringa. Não vai me matar pelo meu HDL beirando a zero ou glomeruloesclerose focal segmentar por ter crescido demais. Eu posso usar o que eu quiser, não será de droga eu eu morrerei. A vida também não vai me matar de depressão, porque eu aprendi a nadar, e não é por falta de inspiração que ela me afunda. A vida vai me matar de desgosto da idiotice humana. Idiotice, do grego mesmo... de Idiótes... Que era um termo utilizado para definir as pessoas que só se preocupavam consigo mesmas. A vida vai me matar de esperança. Esperança do verbo "Esperançar". De "Esperançar" que, lá no fundinho, as pessoas se preocupam com as outras, se elas vão se machucar com o que fazemos ou não. Por fim, a vida vai me matar com a mais lenta das falências múltiplas de órgãos. A vida vai me matar do coração, mas não vai ser com uma hipertrofia ventricular. A vida vai mesmo é ir atrofiando cada miócito, e um dia o coração vai parar de bater porque tá cansado de insistir em bater pelos outros. A vida vai me matar de vasculite, mas não com uma simples inflamação que leve a uma estenose e a subitez de um aneurisma. A vida vai mesmo é poluir o sangue que circula pelos 98km de vasos sanguíneos do meu corpo, inflamando cada célula do meu endotélio vascular. A vida vai me matar de pancreatite, porque um dia esse órgão misto vai parar de produzir enzimas que me permitam digerir a idiotice dos outros, e os hormônios que os jogam para dentro das minhas células neurais. A vida vai me matar de falência hepática, porque uma hora meu fígado vai cansar de metabolizar a as toxinas que a existência me faz engolir todos os dias com o mau que as pessoas fazem umas as outras, e ainda tem coragem de procurar uma explicação que só serve para gerar alivio a própria consciência. A vida vai me matar de doença renal crônica, porque não não vai restar um glomérulo para depurar o mal que absorvo, e sequer um néfron pra regular a pressão interna que as minhas ideologias e convicções alteram em mim. A vida vai me matar de leucemia, mas porque um dia meu corpo vai cansar de se defender das agressões do mundo, e destruirá cada célula de defesa que ainda reproduzo contra ele. A vida vai me matar de anemia, que não será ferropriva, porque a vida é metal pesado. Que não será falciforme, porque a vida se mantém mesmo pela metade. E que não será megaloblástica, porque ela compensa o pouco que tem, criando espaço para absorver ainda mais. Mesmo que meus pulmões inalem o ar que me cerca, o meu corpo irá apenas me privar do oxigênio que recebe os elétrons da cadeia fosforilativa e alimenta cada uma das minhas células. Porque entre a primeira inspiração e a última, os radicais livres foram muito maiores que os antioxidantes. E na impossibilidade de gerar mais um só ATP, a célula que cria e mantém a vida cometerá o mais premeditado dos suicídios, apenas por estar cansada de neutralizar os danos que esse metabolismo causa. A apoptose terminará logo após uma pequena mensagem contida em meu DNA, que dizia: "Eu tentei".

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