Por que
não sou Cristão
Um exame
da idéia divina e do cristianismo
Ateus.net
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Autor:
Bertrand Russell
Tradução:
Diego Barreto Haddad
Como
vosso presidente vos disse, o assunto que vou falar-vos esta noite se intitula:
“Porque não sou
cristão”.
Talvez fosse bom, antes de mais nada, que procurássemos formular o que se
entende pela
palavra
“cristão”. É ela usada, hoje em dia, por um grande número de pessoas, num
sentido muito
impreciso.
Para alguns, não significa senão uma pessoa que procura viver uma vida
virtuosa. Neste
sentido,
creio que haveria cristãos em todas as seitas e em todos os credos; mas não me
parece que esse
seja o
sentido próprio da palavra, pois isso implicaria que todas as pessoas que não
são cristãs – todos os
budistas,
confucianos, maometanos e assim por diante – não estão procurando viver uma
vida virtuosa.
Não
considero cristã qualquer pessoa que tente viver decentemente de acordo com sua
razão. Penso que
se deve
ter uma certa dose de crença definida antes que a gente tenha o direito de se
considerar cristão.
Essa
palavra não tem hoje o mesmo sentido que tinha ao tempo de Santo Agostinho e de
Santo Tomás de
Aquino.
Naqueles dias, quando um homem se dizia cristão, sabia-se o que ele queria
significar. As
pessoas
aceitavam toda uma série de crenças estabelecidas com grande precisão, e
acreditavam, com
toda a
força de suas convicções, em cada sílaba de tais crenças.
Que é um
cristão?
Hoje em
dia não é bem assim. Tem-se de ser um pouco mais vago quanto ao sentido de
cristianismo.
Penso, porém, que há dois itens diferentes e essenciais para que alguém se
intitule cristão.
O
primeiro é de natureza dogmática – a saber, que tem-se de acreditar em Deus e
na imortalidade. Se
não se
acredita nessas duas coisas, não penso que alguém possa chamar-se,
apropriadamente, cristão.
Além
disso, como o próprio nome o indica, deve-se ter alguma espécie de crença
acerca de Cristo. Os
maometanos,
por exemplo, também acreditam em Deus e na imortalidade, no entanto,
dificilmente
poderiam
chamar-se cristãos. Acho que se precisa ter, no mínimo, a crença de que Cristo
era, se não
divino,
pelo menos o melhor e o mais sábio dos homens. Se não tiverdes ao menos essa
crença quanto ao
Cristo,
não creio que tenhais qualquer direito de intitular-vos cristãos. Existe,
naturalmente, um outro
sentido,
que poderá ser encontrado no Whitaker’s Almanack e em livros de geografia, nos
quais se diz que
a
população do mundo se divide em cristãos, maometanos, adoradores de fetiches e
assim por diante – e,
nesse
sentido, somos todos cristãos. Os livros de geografia incluem-nos todos, mas
isso num sentido
puramente
geográfico, que, parece-me, podemos ignorar. Por conseguinte, julgo que, ao
dizer-vos que
não sou
cristão, tenho de contar-vos duas coisas diferentes: primeiro, por que motivo
não acredito em
Deus e
na imortalidade e, segundo, por que não acho que Cristo foi o melhor e o mais
sábio dos homens,
embora
eu lhe conceda um grau muito elevado de bondade moral.
Mas,
devido aos esforços bem-sucedidos dos incrédulos no passado, não poderia
valer-me de uma
definição
de cristianismo tão elástica como essa. Como disse antes, antigamente ela
possuía um sentido
muito
mais vigoroso. Incluía, por exemplo, a crença no inferno. A crença no fogo
eterno do inferno era
cláusula
essencial da fé cristã até tempos bastante recentes. Neste país, como sabeis,
deixou de ser item
essencial
devido a uma decisão do Conselho Privado e, por causa dessa decisão, houve uma
dissensão
entre o
Arcebispo de Cantuária e o Arcebispo de York – mas, neste país, a nossa
religião é estabelecida
por ato
do Parlamento e, por conseguinte, o Conselho Privado pôde sobrepor-se a Suas
Excelências
Reverendíssimas
e o inferno deixou de ser coisa necessária a um cristão. Não insistirei,
portanto, em que
um
cristão deva acreditar no inferno.
A
existência de Deus
Esta
questão da existência de Deus é um assunto longo e sério, e, se eu tentasse
tratar do tema de
maneira
adequada, teria de reter-vos aqui até o advento do Reino dos Céus, de modo que
me perdoareis
se o
abordar de maneira um tanto sumária. Sabeis, certamente, que a Igreja Católica
estabeleceu como
dogma
que a existência de Deus pode ser provada sem ajuda da razão. Trata-se de um
dogma um tanto
curioso,
mas é um de seus dogmas. Tiveram de introduzi-lo porque, em certa ocasião, os
livrespensadores
adotaram
o hábito de dizer que havia tais e tais argumentos que a simples razão poderia
levantar
contra a existência de Deus, mas eles certamente sabiam, como uma questão de
fé, que Deus
existia.
Tais argumentos e razões foram minuciosamente expostos, e a Igreja Católica
achou que devia
acabar
com aquilo. Estabeleceu, por conseguinte, que a existência de Deus pode ser
provada sem ajuda
da
razão, e seus dirigentes tiveram de estabelecer o que consideravam argumentos
capazes de prová-lo.
Há, por
certo, muitos deles, mas tomarei apenas alguns.
O
argumento da causa primeira
Talvez o
mais simples e fácil de se compreender seja o argumento da Causa Primeira.
Afirma-se que
tudo o
que vemos neste mundo tem uma causa e que, se retrocedermos cada vez mais na
cadeia de tais
causas,
acabaremos por chegar a uma Causa Primeira, e que a essa Causa Primeira se dá o
nome de
Deus.
Esse argumento, creio eu, não tem muito peso hoje em dia, em primeiro lugar
porque causa já não
é bem o
que costumava ser. Os filósofos e os homens de ciência têm martelado muito a
questão de
causa, e
ela não possui nada que se assemelhe à vitalidade que tinha antes; mas, à parte
tal fato, podese
ver que
o argumento de que deve haver uma Causa Primeira é um argumento que não pode
ter
qualquer
validade. Posso dizer que quando era jovem e debatia muito seriamente em meu
espírito tais
questões,
eu, durante muito tempo, aceitei o argumento da Causa Primeira, até que, certo
dia, aos
dezoito
anos de idade, li a Autobiografia de John Stuart Mill, lá encontrando a
seguinte sentença: “Meu pai
ensinou-me
que a pergunta ‘Quem me fez?’ não pode ser respondida, já que sugere
imediatamente a
pergunta
subseqüente: ‘Quem fez Deus?’”. Essa simples sentença me mostrou, como ainda
hoje penso, a
falácia
do argumento da Causa Primeira. Se tudo tem de ter uma causa, então Deus deve
ter uma causa.
Se pode
haver alguma coisa sem causa, pode ser muito bem ser tanto o mundo como Deus,
de modo que
não pode
haver validade alguma em tal argumento. Este é exatamente da mesma natureza que
o ponto
de vista
hindu, de que o mundo se apoiava sobre um elefante e o elefante sobre uma
tartaruga, e quando
alguém
perguntava: “E a tartaruga?”, o indiano respondia: “Que tal se mudássemos de
assunto?” O
argumento,
na verdade, não é melhor do que este. Não há razão pela qual o mundo não
pudesse vir a ser
sem uma
causa; por outro lado, tampouco há qualquer razão pela qual o mesmo não devesse
ter sempre
existido.
Não há razão, de modo algum, para se supor que o mundo teve um começo. A idéia
de que as
coisas
devem ter um começo é devida, realmente, à pobreza de nossa imaginação. Por
conseguinte, eu
talvez
não precise desperdiçar mais tempo com o argumento acerca da Causa Primeira.
O
argumento da lei natural
Há, a
seguir, um argumento muito comum relativo à lei natural. Foi esse argumento
predileto
durante
todo o século XVIII, principalmente devido à influência de Sir Isaac Newton e
de sua cosmogonia.
As
pessoas observavam os planetas girar em torno do Sol segundo a lei da
gravitação e pensavam que
Deus
dera uma ordem a tais planetas para que se movessem de modo particular – e que
era por isso que
eles
assim o faziam. Essa era, certamente, uma explicação simples e conveniente, que
lhes poupava o
trabalho
de procurar quaisquer novas explicações para a lei da gravitação. Hoje em dia,
explicamos a lei
da
gravitação de um modo um tanto complicado, apresentado por Einstein. Não me
proponho fazer aqui
uma
palestra sobre a lei da gravitação tal como foi interpretada por Einstein, pois
que também isso
exigiria
algum tempo; seja como for, já não temos a mesma espécie de lei natural que
tínhamos no
sistema
newtoniano, onde, por alguma razão que ninguém podia compreender, a natureza
agia de
maneira
uniforme. Vemos, agora, que muitas coisas que considerávamos como leis naturais
não passam,
na
verdade, de convenções humanas. Sabeis que mesmo nas mais remotas profundezas
do sistema
estelar
uma jarda tem ainda três pés de comprimento. Isso constitui, sem dúvida, fato
notabilíssimo, mas
dificilmente
poderíamos chamá-lo de lei da natureza. E, assim, muitíssimas outras coisas
antes encaradas
como
leis da natureza são dessa espécie. Por outro lado, qualquer que seja o
conhecimento a que
possamos
chegar sobre a maneira de agir dos átomos, veremos que eles estão muito menos
sujeitos a
leis do
que as pessoas julgam, e que as leis a que a gente chega são médias
estatísticas exatamente da
mesma
classe das que ocorreriam por acaso. Há, como todos nós sabemos, uma lei
segundo a qual, no
jogo de
dados, só obteremos dois seis apenas uma vez em cerca de trinta e seis lances,
e não encaramos
tal fato
como uma prova de que a queda dos dados é regulada por um desígnio; se, pelo
contrário, os
dois
seis saíssem todas as vezes, deveríamos pensar que havia um desígnio. As leis
da natureza são
dessa
espécie, quanto ao que se refere a muitíssimas delas. São médias estatísticas
como as que
surgiriam
das leis do acaso – e isso torna todo este assunto das leis naturais muito
menos impressionante
do que
em outros tempos. Inteiramente à parte disso, que representa um estado
momentâneo da ciência
que poderá
mudar amanhã, toda a idéia de que as leis naturais subentendem um legislador é
devida à
confusão
entre as leis naturais e as humanas. As leis humanas são ordens para que
procedamos de certa
maneira,
permitindo-nos escolher se procedemos ou não da maneira indicada; mas as leis
naturais são
uma
descrição de como as coisas de fato procedem e, não sendo senão uma mera
descrição do que elas
de fato
fazem, não se pode argüir que deve haver alguém que lhes disse para que assim
agissem, porque,
mesmo
supondo-se que houvesse, estaríamos diante da pergunta: “Por que Deus lançou
justamente
essas
leis naturais e não outras?” Se dissermos que Ele o fez a Seu próprio
bel-prazer, e sem qualquer
razão
para tal, verificaremos, então, que há algo que não está sujeito à lei e, desse
modo, se interrompe
a nossa
cadeia de leis naturais. Se dissermos, como o fazem os teólogos mais ortodoxos,
que em todas as
leis
feitas por Deus Ele tinha uma razão para dar tais leis em lugar de outras –
sendo que a razão,
naturalmente,
seria a de criar o melhor universo, embora a gente jamais pensasse nisso ao
olhar o
mundo –,
se havia uma razão para as leis ministradas por Deus, então o próprio Deus
estava sujeito à lei,
por
conseguinte, não há nenhuma vantagem em se apresentar Deus como intermediário.
Temos aí
realmente
uma lei exterior e anterior aos editos divinos, e Deus não serve então ao nosso
propósito, pois
que Ele
não é o legislador supremo. Em suma, todo esse argumento da lei natural já não
possui nada que
se
pareça com seu vigor de antigamente. Estou viajando no tempo em meu exame dos
argumentos. Os
argumentos
quanto à existência de Deus mudam de caráter à medida que o tempo passa. Eram,
a
princípio,
argumentos intelectuais, rígidos, encerrando certas idéias errôneas bastante
definidas. Ao
chegarmos
aos tempos modernos, essas idéias se tornam intelectualmente menos respeitáveis
e cada vez
mais
afetadas por uma espécie de moralizadora imprecisão.
O
argumento teleológico (argumento do design)
O passo
seguinte nos conduz ao argumento da prova teleológica da existência de Deus.
Vós todos
conheceis
tal argumento: tudo no mundo é feito justamente de modo a que possamos nele
viver, e se ele
fosse,
algum dia, um pouco diferente, não conseguiríamos viver nele. Eis aí o
argumento da prova
teleológica
de Deus. Toma ele, às vezes, uma forma um tanto curiosa; afirma-se, por
exemplo, que as
lebres
têm rabos brancos a fim de que possam ser facilmente atingidas por um tiro. Não
sei o que as
lebres
pensariam deste destino. É um argumento fácil de se parodiar. Todos vós
conheceis a observação
de
Voltaire, de que o nariz foi, evidentemente, destinado ao uso dos óculos. Essa
espécie de gracejo
acabou
por não estar tão fora do alvo como poderia ter parecido no século XVIII, pois
que, desde o tempo
de
Darwin, compreendemos muito melhor por que os seres vivos são adaptados ao meio
em que vivem.
Não é o
seu meio que se foi ajustando aos mesmos, mas eles é que foram se ajustando ao
meio, e isso é
que
constitui a base da adaptação. Não há nisso prova alguma de desígnio divino.
Quando
se chega a analisar o argumento teleológico da prova da existência de Deus, é
sumamente
surpreendente
que as pessoas possam acreditar que este mundo, com todas as coisas que nele
existem,
como
todos os seus defeitos, deva ser o melhor mundo que a onipotência e a
onisciência tenham podido
produzir
em milhões de anos. Realmente não posso acreditar nisso. Achais, acaso, que, se
vos fossem
concedidas
onipotência e onisciência, além de milhões de anos para que pudésseis
aperfeiçoar o vosso
mundo,
não teríeis podido produzir nada melhor do que a Ku-Klux-Klan ou os fascistas?
Realmente, não
me
impressiono muito com as pessoas que dizem: “Olhem para mim: sou um produto tão
esplêndido que
deve
haver um desígnio no universo”. Não estou muito impressionado pelo esplendor
dessas pessoas.
Ademais,
se aceitais as leis ordinárias da ciência, tereis de supor que não só a vida
humana como a vida
em geral
neste planeta se extinguirão em seu devido curso: isso constitui uma fase da
decadência do
sistema
solar. Em certa fase de decadência, teremos a espécie de condições de
temperatura, etc.,
adequadas
ao protoplasma, e haverá vida, durante breve tempo, na vida do sistema solar.
Podeis ver na
Lua a
espécie de coisa a que a Terra tende: algo morto, frio e inanimado.
Dizem-me
que tal opinião é depressiva e, às vezes, há pessoas que nos confessam que, se
acreditassem
nisso, não poderiam continuar vivendo. Não acrediteis nisso, pois que não passa
de tolice.
Na
verdade, ninguém se preocupa muito com o que irá acontecer daqui a milhões de
anos. Mesmo que
pensem
que estão se preocupando muito com isso, não estão, na realidade, fazendo outra
coisa senão
enganar
a si próprias. Estão preocupadas com algo muito mais mundano – talvez mesmo com
a sua má
digestão.
Na verdade, ninguém se torna realmente infeliz ante a idéia de algo que irá
acontecer a este
mundo
daqui a milhões e milhões de anos. Por conseguinte, embora seja melancólico
supor-se que a vida
irá se
extinguir (suponho, ao menos, que se possa dizer tal coisa, embora, às vezes,
quando observo o
que as
pessoas fazem de suas vidas, isso me pareça quase um consolo) isso não é coisa
que torne a vida
miserável.
Faz apenas com que a gente volte a atenção para outras coisas.
Os
argumentos morais em favor da deidade
Chegamos,
agora, no estágio subseqüente do que eu denomino a descendência intelectual que
os
teístas
tem feito em suas argumentações, e deparamo-nos com o que se chama de
argumentos morais
para a
existência de Deus. Vós todos sabeis, por certo, que costumava haver,
antigamente, três
argumentos
intelectuais a favor da existência de Deus, os quais foram todos utilizados por
Immanuel Kant
em sua
Crítica da Razão Pura; mas, logo depois de haver utilizado tais argumentos, inventou
ele um
novo, um
argumento moral, e isso o convenceu inteiramente. Kant era como muita gente: em
questões
intelectuais,
mostrava-se cético, mas, em questões morais, acreditava implicitamente nas
máximas
hauridas
no colo de sua mãe. Eis aí um exemplo daquilo que os psicanalistas tanto
ressaltam: a influência
imensamente
mais forte de nossas primeiras associações do que das que se verificam mais
tarde.
Kant,
como digo, inventou um novo argumento moral quanto à existência de Deus, e o
mesmo, em
formas
várias, se tornou grandemente popular durante o século XIX. Tem hoje toda a
espécie de formas.
Uma
delas é a que afirma que não haveria o bem ou o mal a menos que Deus existisse.
Não estou, no
momento,
interessado em saber se há ou não uma diferença entre o bem e o mal. Isso é
outra questão.
O ponto
em que estou interessado é que, se estamos tão certos de que existe uma
diferença entre o bem
e o mal,
nos achamos, então, na seguinte situação: é essa diferença devida à
determinação de Deus ou
não? Se
é devida à vontade de Deus, então não existe, para o próprio Deus, diferença
entre o bem e o
mal, e
não constitui mais uma afirmação significativa o dizer-se que Deus é bom. Se
dissermos, como o
fazem os
teólogos, que Deus é bom, teremos então de dizer que o bem e o mal possuem
algum sentido
independente
da vontade de Deus, porque os desejos de Deus são bons e não-maus
independentemente
do fato
dele os haver feito. Se dissermos tal coisa, teremos então de dizer que não foi
apenas através de
Deus que
o bem e o mal passaram a existir, mas que são, em sua essência, logicamente
anteriores a
Deus.
Poderíamos,
por certo, se assim desejássemos, dizer que havia uma deidade superior que dava
ordens
ao Deus que fez este mundo, ou, então, poderíamos adotar o curso seguido por
alguns agnósticos
– curso
que me pareceu, com freqüência, bastante plausível –, segundo o qual, na
verdade, o mundo que
conhecemos
foi feito pelo Diabo num momento em que Deus não estava olhando. Há muito que
se dizer
em favor
disso, e não estou interessado em refutá-lo.
O
argumento quanto à reparação da injustiça
Há uma
outra forma muito curiosa de argumento moral, que é a seguinte: dizem que a
existência de
Deus é
necessária a fim de que haja justiça no mundo. Na parte do universo que
conhecemos há grande
injustiça
e, não raro, os bons sofrem e os maus prosperam, e a gente mal sabe qual dessas
coisas é mais
molesta;
mas, para que haja justiça no universo como um todo, temos de supor a
existência de uma vida
futura
para reparar a vida aqui na Terra. Assim, dizem que deve haver um Deus, e que
deve haver céu e
inferno,
a fim de que, no fim, possa haver justiça. É esse um argumento muito curioso.
Se encarássemos
o
assunto de um ponto de vista científico, diríamos: “Afinal de contas, conheço
apenas este mundo. Nada
sei do
resto do universo, mas, tanto quanto se pode raciocinar acerca das
probabilidades, dir-se-ia que
este
mundo constitui uma bela amostra e, se há aqui injustiça, é bastante provável
que também haja
injustiça
em outras partes”. Suponhamos que recebeis um engradado de laranjas e que, ao
abri-lo,
verificais
que todas as laranjas de cima estão estragadas. Não diríeis, em tal caso: “As
de baixo devem
estar
boas, para compensar as de cima”. Diríeis: “É provável que todas estejam
estragadas”. E é
precisamente
isso que uma pessoa de espírito científico diria a respeito do universo. Diria:
“Encontramos
neste
mundo muita injustiça e, quanto ao que isso se refere, há razão para se supor
que o mundo não é
governado
pela justiça. Por conseguinte, tanto quanto posso perceber, isso fornece um
argumento moral
contra a
deidade e não a seu favor”. Sei, certamente, que os argumentos intelectuais
sobre os quais vos
estou
falando não são, na verdade, de molde a estimular as pessoas. O que realmente
leva os indivíduos
a
acreditar em Deus não é nenhum argumento intelectual. A maioria das pessoas
acredita em Deus
porque
lhes ensinaram, desde tenra infância, a fazê-lo, e essa é a principal razão.
Penso,
ainda, que a seguinte e mais poderosa razão disso é o desejo de segurança, uma
espécie de
impressão
de que há um irmão mais velho a olhar pela gente. Isso desempenha um papel
muito
profundo,
influenciando o desejo das pessoas quanto a uma crença em Deus.
O
caráter de Cristo
Desejo
agora dizer algumas palavras sobre um tema que, penso com freqüência, não foi
tratado
suficientemente
pelos racionalistas, e que é a questão de saber-se se Cristo foi o melhor e o
mais sábio
dos
homens. É geralmente aceito como coisa assente que deveríamos todos concordar
em que assim é.
Não
penso desse modo. Acho que há muitíssimos pontos em que concordo com Cristo
muito mais do que
o fazem
os cristãos professos. Não sei se poderia concordar com Ele em tudo, mas posso
concordar muito
mais do
que a maioria dos cristãos professos o faz. Lembrar-vos-ei que Ele disse: “Não
resistais ao mau,
mas, se
alguém te ferir em tua face direita, apresenta-lhe também a outra”. Isto não
era um preceito
novo,
nem um princípio novo. Foi usado por Lao-Tse e por Buda cerca de quinhentos ou
seiscentos anos
antes de
Cristo, mas não é um princípio que, na verdade, os cristãos aceitem. Não tenho
dúvida de que o
Primeiro-Ministro
(Stanley Baldwin), por exemplo, é um cristão sumamente sincero, mas não
aconselharia
a nenhum
de vós que o ferisse na face. Penso que, então, poderíeis descobrir que ele
considerava esse
texto
como algo que devesse ser empregado em sentido figurado.
Há um
outro ponto que julgo excelente. Lembrar-vos-eis, por certo, de que Cristo
disse: “Não
julgueis,
para que não sejais julgados”. Não creio que vós considerásseis tal princípio
como sendo popular
nos
tribunais dos países cristãos. Conheci, em outros tempos, muitos juízes que
eram cristãos
sumamente
convictos, e nenhum deles achava que estava agindo, no que fazia, de maneira
contrária aos
princípios
cristãos. Cristo também disse: “Dá a quem te pede, e não voltes as costas ao
que deseja que
lhe
emprestes”. É este um princípio muito bom. Vosso Presidente vos lembrou que não
estamos aqui para
falar de
política, mas não posso deixar de observar que as últimas eleições gerais foram
disputadas
baseadas
na questão de quão desejável seria voltar as costas ao que desejava lhe
emprestássemos, de
modo que
devemos presumir que os liberais e os conservadores deste país são constituídos
de pessoas
que não
concordam com os ensinamentos de Cristo, pois que, certamente, naquela ocasião,
voltaram as
costas
de maneira bastante enfática.
Há ainda
uma máxima de Cristo que, penso, contém nela muita coisa, mas não me parece
muito
popular
entre os nossos amigos cristãos. Diz Ele: “Se queres ser perfeito, vai, vende o
que tens, e dá-os
aos
pobres”. Eis aí uma máxima excelente, mas, como digo, não é muito praticada.
Todas estas, penso,
são boas
máximas, embora seja um pouco difícil viver-se de acordo com elas. Quanto a
mim, não afirmo
que o
faça – mas, afinal de contas, isso não é bem o mesmo que o seria tratando-se de
um cristão.
Defeitos
nos ensinamentos de Cristo
Tendo
admitido a excelência de tais máximas, chego a certos pontos em que não
acredito que se
possa
concordar nem com a sabedoria superlativa, nem com a bondade superlativa de
Cristo, tal como
são
descritas nos Evangelhos – e posso dizer aqui que não estou interessado na
questão histórica.
Historicamente,
é muito duvidoso que Cristo haja jamais existido e, se existiu, nada sabemos a
respeito
d’Ele,
de modo que não estou interessado na questão histórica, que é uma questão muito
difícil. Estou
interessado
em Cristo tal como Ele aparece nos Evangelhos, tomando a narrativa bíblica tal
como ela se
nos
apresenta – e nela encontramos algumas coisas que não me parecem muito sábias.
Por um lado, Ele
certamente
pensou que o Seu segundo advento ocorreria em nuvens de glória antes da morte
de toda a
gente
que estava vivendo naquela época. Há muitos textos que o provam. Diz Ele, por
exemplo: “Não
acabareis
de correr as cidades de Israel, sem que venha o Filho do Homem”. E adiante:
“Entre aqueles
que
estão aqui presentes, há alguns que não morrerão, antes que vejam o Filho do
Homem no seu reino”
– e há
uma porção de lugares em que é bastante claro que Ele acreditava que a Sua
segunda vinda
ocorreria
durante a vida dos que então viviam. Essa era a crença de seus primeiros adeptos,
constituindo
a base
de uma grande parte de Seus ensinamentos morais. Quando Ele disse: “Não andeis
inquietos pelo
dia de
amanhã” e outras coisas semelhantes, foi, em grande parte, porque julgava que a
sua segunda
vinda
seria muito em breve e que, por isso, não tinham importância os assuntos
mundanos. Conheci, na
verdade,
cristãos que acreditavam que o segundo advento era iminente. Conheci um pároco
que assustou
terrivelmente
a sua congregação, dizendo-lhe que o segundo advento estava, com efeito,
sumamente
próximo,
mas os membros de seu rebanho se sentiram muito consolados quando viram que ele
estava
plantando
árvores em seu jardim. Os primeiros cristãos acreditaram realmente nisso, e
abstinham-se de
coisas
tais como plantar árvores em seus jardins, pois que aceitaram de Cristo a
crença de que o segundo
advento
estava iminente. Neste sentido claramente ele não foi tão sábio como alguns
outros o foram – e,
certamente,
não se mostrou superlativamente sábio.
O
problema moral
Chega-se,
a seguir, às questões morais. Há, a meu ver, um defeito muito sério no caráter
moral de
Cristo,
e isso porque Ele acreditava no inferno. Quanto a mim, não acho que qualquer
pessoa que seja, na
realidade,
profundamente humana, possa acreditar no castigo eterno. Cristo, certamente,
tal como é
descrito
nos Evangelhos, acreditava no castigo eterno, e a gente encontra,
repetidamente, uma fúria
vinditiva
contra os que não davam ouvidos aos seus ensinamentos – atitude essa nada
incomum entre
pregadores,
mas que, de certo modo, se afasta da excelência superlativa. Não encontrareis,
por exemplo,
tal
atitude em Sócrates. Encontramo-lo bastante suave e cortês para com aqueles que
não queriam ouvilo
– e, na
minha opinião, é muito mais digno de um sábio adotar tal atitude do que
mostrar-se indignado.
Provavelmente
vos lembrareis das coisas que Sócrates disse quando estava agonizando, bem como
das
coisas
que em geral dizia às pessoas que não concordavam com ele.
Vereis
que, nos Evangelhos, Cristo disse: “Serpentes, raça de víboras! Como escapareis
da
condenação
ao inferno?” Isso foi dito a gente que não gostava de seus ensinamentos. Esse
não é,
realmente,
na minha opinião, o melhor tom, e há muitas dessas coisas acerca do inferno.
Há, por certo, o
texto
familiar acerca do pecado contra o Espírito Santo: “Quem falar contra o
Espírito Santo não será
perdoado,
nem neste século nem no futuro”. Este texto causou indizível infelicidade no
mundo, pois que
toda a
espécie de criatura imaginava haver pecado contra o Espírito Santo e achava que
não seria
perdoada
nem neste mundo, nem no outro. Não me parece, realmente, que uma pessoa dotada
de um
grau
adequado de bondade em sua natureza teria posto no mundo receios e terrores
dessa espécie.
Diz
Cristo, ainda: “O Filho do homem enviará os seus anjos, e tirarão do seu reino
todos os
escândalos
e os que praticam a iniqüidade. E lançá-los-ão na fornalha de fogo. Ali haverá
choro e ranger
de
dentes”. E continua a referir-se aos lamentos e ao ranger de dentes. Isso
aparece versículo após
versículo,
e fica bastante evidente ao leitor que há um certo prazer na contemplação dos
lamentos e do
ranger
de dentes, pois que, do contrário, isso não ocorreria com tanta freqüência. Vós
todos vos lembrais,
certamente,
da passagem acerca das ovelhas e das cabras; de como, na segunda vinda, a fim
de separar
as
ovelhas das cabras, irá Ele dizer às cabras: “Apartai-vos de mim, malditos,
para o fogo eterno”. Ele
continua:
“E irão eles para o castigo eterno”. Depois, torna a dizer: “E se a tua mão te
escandaliza, cortaa;
melhor é
entrares na vida aleijado, do que, tendo duas mãos, ires para o inferno, para o
fogo que
nunca se
apaga. Onde o seu verme não morre, e o fogo não se apaga”. Repete também isso
muitas e
muitas
vezes. Devo dizer que considero toda esta doutrina – a de que o fogo eterno é
um castigo para o
pecado –
como uma doutrina de crueldade. É uma doutrina que pôs crueldade no mundo e
submeteu
gerações
a uma tortura cruel – e o Cristo dos Evangelhos, se pudermos aceitá-l’O como os
seus cronistas
O
representam, teria, certamente, de ser considerado, em parte, responsável por
isso.
Há
outras coisas de menor importância. Há, por exemplo, a expulsão dos demônios de
Gerasa, onde,
certamente,
não foi muito bondoso para com os porcos, fazendo com que os demônios neles
entrassem e
se
precipitassem ao mar pelo despenhadeiro. Deveis lembrar-vos de que Ele era
onipotente e teria podido
simplesmente
fazer com que os demônios fossem embora. Mas Ele prefere fazer com que entrem
nos
porcos.
Há, ainda, a curiosa história da figueira, que sempre me deixa um tanto
intrigado. Vós vos
lembrais
do que aconteceu com a figueira. “Pela manhã, quando voltava para a cidade,
teve fome. E,
vendo
uma figueira junto do caminho, aproximou-se dela; e não encontrou nela senão
folhas, e disse-lhe:
Nunca
mais nasça fruto de ti”. E Pedro disse-Lhe: “Vê, Mestre: a figueira que
amaldiçoaste secou”. Essa é
uma
história muito curiosa, pois que aquela não era a estação dos figos e,
realmente, não se podia
censurar
a árvore. Quanto a mim, não me é possível achar que, em questão de sabedoria ou
em questão
de
virtude, Cristo permaneça tão alto como certas outras figuras históricas que
conheço. Nesses sentidos,
eu
colocaria Buda e Sócrates acima d’Ele.
O fator
emocional
Como já
disse, não creio que a verdadeira razão pela qual as pessoas aceitam a religião
tenha algo
que ver
com argumentação. Aceitam a religião por motivos emocionais. Dizem-nos com freqüência
que é
muito
errado atacar-se a religião, pois que a religião torna os homens virtuosos.
Isso é o que me dizem;
eu
jamais o percebi. Conheceis, por certo, a paródia desse argumento, tal como é
apresentado no livro
Erewhom Revisited, de Samuel Butler. Vós vos lembrais de que, em
Erewhom, há um certo Higgs que
chega a
um país remoto e que, após passar lá algum tempo, foge do país num balão. Vinte
anos depois,
volta ao
mesmo país e encontra uma nova religião, na qual é ele adorado sob o nome de
“Filho do Sol”, e
na qual
se afirma que ele subiu ao céu. Verifica que a Festa da Ascensão está prestes a
ser celebrada, e
ouve os
Professores Hanky e Panky dizerem entre si que jamais puseram os olhos no tal
Higgs e que
esperam não
o fazer jamais – mas eles são altos sacerdotes da religião do Filho do Sol.
Higgs sente-se
muito
indignado e, aproximando-se deles, diz-lhes: “Vou desmascarar todo este embuste
e dizer ao povo
de
Erewhom que se tratava apenas de mim, Higgs, e que subi num balão”.
Responderam-lhe: “Não deve
fazer
isso, pois toda a moral deste país gira em torno desse mito e, se souberem que
você não subiu aos
céus,
todos os seus habitantes se tornarão maus”. Persuadido disso, Higgs afasta-se
do país
silenciosamente.
Eis aí a
idéia – a de que todos nós seríamos maus se não nos apegássemos à religião
cristã. Pareceme
que as
pessoas que se apegaram a ela foram, em sua maioria, extremamente más. Tendes
este fato
curioso:
quanto mais intensa a religião em qualquer época, e quanto mais profunda a
crença dogmática,
tanto
maior a crueldade e tanto pior o estado das coisas. Nas chamadas Idades da Fé,
quando os homens
realmente
acreditavam na religião cristã em toda a sua inteireza, houve a Inquisição, com
as suas
torturas;
houve milhares de infelizes queimadas como feiticeiras – e houve toda a espécie
de crueldade
praticada
sobre toda a espécie de gente em nome da religião.
Constatareis,
se lançardes um olhar pelo mundo, que cada pequenino progresso verificado nos
sentimentos
humanos, cada melhoria no direito penal, cada passo no sentido da diminuição da
guerra,
cada
passo no sentido de um melhor tratamento das raças de cor, e que toda
diminuição da escravidão,
todo o
progresso moral havido no mundo, foram coisas combatidas sistematicamente pelas
Igrejas
estabelecidas
do mundo. Digo, com toda convicção, que a religião cristã, tal como se acha
organizada em
suas
Igrejas, foi e ainda é a principal inimiga do progresso no mundo.
De que
forma as igrejas retardaram o progresso
Talvez
julgueis que estou indo demasiado longe, quando digo que ainda assim é. Não
julgo que
esteja.
Tomemos apenas um fato. Concordareis comigo, se eu o citar. Não é um fato
agradável, mas as
Igrejas
nos obrigam a referir-nos a fatos que não são agradáveis. Suponhamos que, neste
mundo em que
hoje
vivemos, uma jovem inexperiente case com um homem sifilítico. Neste caso, a
Igreja Católica diz:
“Esse é
um sacramento indissolúvel. Devem permanecer juntos por toda a vida”. E nenhum
passo deve
ser dado
por essa mulher no sentido de evitar que dê à luz filhos sifilíticos. Isso é o
que diz a Igreja
Católica.
Quanto a mim, digo que isso constitui uma crueldade diabólica, e ninguém cujas
simpatias
naturais
não tenham sido embotadas pelo dogma, ou cuja natureza moral não esteja
inteiramente morta
a todo
sentido de sofrimento, poderia afirmar que é justo e certo que tal estado de
coisas deva continuar.
Este é
apenas um dos exemplos. Há muitas outras maneiras pela qual a Igreja, no
momento, com
sua insistência
sobre o que prefere chamar moralidade, inflige a toda a espécie de pessoas
sofrimentos
imerecidos
e desnecessários. E, naturalmente, como todos nós sabemos, é ainda, em grande
parte,
contrária
ao progresso e ao aperfeiçoamento de todos os meios tendentes a diminuir o
sofrimento no
mundo,
pois que costuma rotular de moralidade certas regras de conduta estreitas que
nada têm a ver
com a
felicidade humana – e quando se diz que isto ou aquilo deve ser feito, pois que
contribuiria para a
felicidade
humana, eles acham que nada tem a ver, absolutamente, com tal assunto. “Que tem
a
felicidade
a ver com a moral? O objetivo da moral não é tornar as pessoas felizes”.
O medo –
a base da religião
A
religião baseia-se, penso eu, principalmente e antes de tudo, no medo. É, em
parte, o terror do
desconhecido
e, em parte, como já o disse, o desejo de sentir que se tem uma espécie de
irmão mais
velho
que se porá de nosso lado em todas as nossas dificuldades e disputas. O medo é
a base de toda
essa
questão: o medo do mistério, o medo da derrota, o medo da morte. O medo é a
fonte da crueldade
e, por
conseguinte, não é de estranhar que a crueldade e a religião tenham andado de
mãos dadas. Isso
porque o
medo é a base dessas duas coisas. Neste mundo, podemos agora começar a compreender
um
pouco as
coisas e a dominá-las com a ajuda da ciência, que abriu caminho, passo a passo,
contra a
religião
cristã, contra as Igrejas e contra a oposição de todos os antigos preceitos. A
ciência pode ajudarnos
a
superar este medo covarde com o qual a humanidade tem vivido por tantas
gerações.
A
ciência pode ensinar-nos, e penso que também os nossos corações podem fazê-lo,
a não mais
procurar
apoios imaginários, a não mais inventar aliados no céu, mas a contar antes com
os nossos
próprios
esforços aqui embaixo para tornar este mundo um lugar adequado para viver, em
vez da espécie
de lugar
a que as igrejas, durante todos estes séculos, o converteram.
O que
devemos fazer
Devemos
apoiar-nos em nossos próprios pés e olhar o mundo honestamente – as coisas
boas, as
coisas
más, suas belezas e suas fealdades; ver o mundo como ele é, e não temê-lo.
Conquistar o mundo
por meio
da inteligência, e não apenas abjetamente, subjugados pelo terror que ele nos
desperta. Toda a
concepção
de Deus é uma concepção derivada dos antigos despotismos orientais. É uma
concepção
inteiramente
indigna de homens livres. Quando vemos na igreja pessoas a depreciar a si
próprias e a
dizer
que são miseráveis pecadores e tudo o mais, tal coisa nos parece desprezível e
indigna de criaturas
humanas
que se respeitem. Devemos levantar-nos e encarar o mundo de frente,
honestamente. Devemos
fazer do
mundo o melhor que nos seja possível, e se o mesmo não é tão bom quanto
desejamos, será,
afinal
de contas, ainda melhor do que esses outros fizeram dele durante todos estes
séculos. Um mundo
bom
necessita de conhecimento, bondade e coragem; não precisa de nenhum anseio
saudoso pelo
passado,
nem do encarceramento das inteligências livres por meio de palavras proferidas
há muito tempo
por
homens ignorantes. Necessita de uma perspectiva intemente e de uma inteligência
livre. Necessita de
esperança
para o futuro, e não passar o tempo todo voltado para trás, para um passado morto,
que,
assim o
confiamos, será ultrapassado de muito pelo futuro que a nossa inteligência pode
criar.
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